segunda-feira, 6 de agosto de 2012

Torta de Maçã



Alex:

A gente se conheceu numa balada onde vão gays, vão héteros, vão bis e todo mundo bebe, conversa, dança e não está nem aí pra vida do outro. Eu estava com um amigo, cujo apelido é “Mãe de Santo”, porque todo mundo na festa parece que não passa sem vir cumprimentá-lo. O Marcelo foi um deles e foi assim que ele me foi apresentado. Na hora, eu comentei com o Mãe: “Esse Marcelo é um tesão!” Na verdade, eu não me lembrava disso, eu já o conhecia. Na noite interior, o Mãe e eu tínhamos ido na festa de despedida de um cara. Marcelo estava lá e nós nos falamos um pouco. Como a festa essa estava chata, e eu estava entediado, fui embora logo. Mas, no dia seguinte, fui direto deixando claro pro Marcelo quais eram as minhas intenções. Eu não me considero um cara muito charmoso. Há quem diga, aliás, que meu sex appeal é zero. E pode até ser que sim, não duvido, já que minha tosca e agropecuária forma de conquistar o Marcelo não deu em nada naquele início de noite. De repente, eu não sou vaidoso, ele disse que tinha que ir no banheiro e eu entendi o que isso queria dizer. Tempo depois, me avisa o Mãe: “Não olha praquele lado de lá!” E eu devolvi: “Já vi!” Naquele lado de lá, o Marcelo estava aos beijos com um médico da marinha. O Mãe conhecia todo mundo. As horas foram passando e eu já tinha me dado por vencido naquele noite, quando, do nada, reaparece o Marcelo, sorridente e lindo, como nada tivesse acontecido no intervalo de, sei lá, meia hora. Voltou dessa vez, para o meu prazer, correspondendo, todo em olhares para mim. Eu já disse que não sou vaidoso, então, começamos a ficar e a festa mudava de cor (pelo menos, para nós). Me equilibrando na ponta dos pés, eu sou bem mais baixo que e o Marcelo, dois momentos são muito claros naquela madrugada: eu, por algum motivo, com uma tara nunca antes sentida, passei o tempo todo brincando com o dedo no umbigo dele, passando a mão por baixo da camisa de botão que ele vestia. A outra lembrança sou eu beliscando o Mãe, que estava na mesma parede que nós, ao nosso lado, aos beijos que uma bichinha vestibulanda, todas sempre loucas por ele.
            No fim da noite, convidei o Marcelo pra vir pra minha casa. A princípio, ele não queria vir. Tinha vergonha de ir pra casa de alguém desconhecido, mas aceitou quando eu disse que tinha feito uma torta de maçã, a preferida dele como me contou. Meses depois, me revelou que, na verdade, aceitou vir por causa da minha cara de pau em convidá-lo, assim, de supetão... Chegando em casa, Marcelo ganhou muitos pontos comigo ao pedir para tomar banho. A transa, que aconteceu imediatamente depois, foi maravilhosa. A segunda, que rolou quando acordamos, melhor ainda. Já era domingo e, depois de comer a torta de maçã, que era de verdade!, fomos caminhar na praia e lá ele pegou na minha mão e me deu um beijo! Naquele momento, brilharam umas estrelinhas que ainda brilham quando lembro desse momento. O Marcelo era tudo que eu procurava!
O namoro realmente começou umas duas semanas mais tarde. O Marcelo se formou em Farmácia e, na formatura, me apresentou para todos os amigos dele. A gente se beijou na frente de todos que viram, com olhos arregalados, eu brincar livremente no umbigo dele já, nesse momento, um hábito comum para nós. Me lembro muito bem da primeira vez que a palavra namoro apareceu com todas as letras. O Marcelo havia sugerido o nome intermediário de “romance” e eu adorei a proposta no começo. Um dia, eu estava deitado sobre ele, ele balançando a cabeça pra lá e para cá de olhos fechados enquanto eu beijava o pescoço, a boca, a bochecha, os olhos, a orelha, o cabelo e dizendo “meu lindo”, que era como nós nos chamávamos. Foi, então, que eu deixei escapar: “Meu namorado lindo!”. Ele abriu os olhos, ficamos alguns segundos nos olhando e, então, nos demos um beijo inesquecível.
Durou quase dois anos (um ano e onze meses) e terminou por pura falta de afinidade na vida prática, já que, na vida afetiva, nada faltava. Nem sei se existe mesmo essa divisão... Eu não saberia dizer exatamente quais são os contornos. Mas sei que eu e o Marcelo não conseguíamos nos entender sobre pequenas coisas, não tínhamos nenhum hobbie em comum, e, muito explosivo, ele me ofendia muito, mesmo que, depois, me pedisse desculpas. Eu fazia os programas dele com carinho e, é verdade, ele fazia os meus com carinho também, mas não tínhamos nenhum programa que pudesse ser chamado de Nosso, mesmo depois de mais de um ano de relacionamento. Era inevitável que, mais cedo ou mais tarde, começassem os desentendimentos e esses cada vez mais sérios. Na minha opinião, afinidade e gostos comuns são obrigatórios na vida a dois. Essenciais.
Terminou e, eu não quero falar disso, em meio a uma briga por algum motivo fútil. Aos berros, ele me jogou uma raiva da qual eu já estava cansado e saiu batendo a porta com força. Quando me ligou, eu não atendi. Ligou mais dois dias e eu não atendi. Três dias depois, eu mandei uma mensagem dizendo eu o namoro havia terminado. Uma semana depois da briga, organizei as coisas dele sobre a cama do meu quarto de hóspedes e, enquanto eu estava no trabalho, ele veio buscá-las. A zeladora do prédio me contou que ele chorou abraçado nela. Dez dias depois disso, marquei um café, mas ele não apareceu. Com raiva de mim, nunca mais me procurou. E foi pela raiva sentida por ele que tudo terminou.
Esse foi meu segundo relacionamento: muito tesão, muito contraste, desafio constante e cansante. Sinto muita falta dele, mas vai passar. 

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