terça-feira, 7 de agosto de 2012

Troféu



Lúcia:


Eu o conheci em uma empresa que prestava serviço para a qual eu trabalhava. Cabelos loiros, olhos claros, meio tímido e bastante alto. Eu, que ficava excitada quando ele passava perto da minha mesa, logo fiz alguma coisa para me aproximar. Ele falava pouco, mas sorria e era gentil comigo. Tenho a impressão de que a primeira vez que saímos juntos fui eu quem o convidei. Não lembro se ele aceitou, mas lembro, isso faz anos, dele pegando na minha mão e me convidando para outras coisas. Não demorou muito e eu me transformei em plateia dos jogos de vôlei dele com os amigos, encontros com a família dele, essas coisas. Foi rápido e sem grandes momentos. Foi natural, como o amor deve ser. Eu era oito anos mais velha que ele e formada, mas não jogava voley e raras vezes pegaram na minha mão no cinema. Os primeiros meses, assim, foram passando. Depois de quase cinco anos solteira, era maravilhoso vivenciar o amor novamente. E eu sentia que tinha nascido para aqueles momentos, porque era neles que eu me sentia mais eu.

Quando completamos seis meses de namoro mais ou menos, eu sou boa em números, o irmão dele ficou noivo. Hoje, eu acho que isso o fez apressar as coisas e me pedir em noivado também. Era para ser surpresa no dia do meu aniversário, mas acabou não sendo porque a noiva do irmão dele acabou deixando escapar. Mesmo assim, foi emocionante pra mim, pra minha família, pra todos nós. Mal podia acreditar naquela aliança no meu dedo. Era um peso, uma responsabilidade, um troféu que eu, já passada dos trinta, ainda não tinha levantado. Apesar de um certo medo, eu estava feliz. A gente se falava todo o tempo, várias mensagens por dia, era como se um bastasse para o outro e nada mais fosse necessário. Eu gostava de tê-lo por perto, eu gostava de estar perto também. Havia presença constante e tudo parecia estar seguro.

Já ia fazer um ano que eu o conhecia quando algumas pontas começaram a se ligar, detalhes que não fizeram sentido no início, mas que tiveram continuidade depois. Por exemplo, eu só fui descobrir que ele não tinha a idade que tinha me dito, o bairro onde ele realmente morava e que nunca fizera faculdade uns dois meses depois do namoro já ter começado. Nada disso me era importante, porque, afinal de contas, era bom estar com ele. Na semana do vestibular, veio a bomba. Ele, sumido há três dias, terminou comigo por mensagem de texto no celular. O chão sumiu, a segurança se esvaneceu, minha cabeça girou. O choque de lógica surgiu como a única barra segura em que eu podia me segurar. Somei três mais três, uni as mentiras do início com pequenos detalhes do meio e veio o resultado. Por que mentir e por que terminar de um jeito tão frio se eu nunca o havia dado motivos para tanto gelo?

O casamento do irmão dele acabou logo em seguida e, nessa altura, eu já era amiga da recém divorciada. Foi ela quem me contou que ele havia passado na prova e estava cursando faculdade. Não me contentei e fui atrás. Usando meus contatos, eu estudei onze anos na faculdade que ele dizia estudar, descobri que ele numa tinha passado em vestibular algum. Meu sentimento é que meu namoro e meu noivado com ele eram tão vazios e sem sentido quanto a festa de comemoração do vestibular que a família havia feito pra ele.

Fui cuidar da minha vida. Voltei a me envolver com o meu trabalho e comigo mesma. Eu não vou negar que chorei por esta história não ter o fim que eu queria, mas não posso, e nem quero, imaginar o que teria sido a minha vida ao ter que conviver com incertezas desse tamanho todos os dias. E, se me arrependo de algo, é de ter devolvido pra ele a aliança. Hoje, meio empoeirada e sem brilho, ela seria ainda um troféu com a inscrição "antes só do que mal acompanhada".

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